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O Anti-Lula

Vou arrumar inimigos hoje… Mas resolvi postar logo, antes do jogo contra a Costa do Marfim, porque seria muito fácil defender uma ideia depois que ela já deu certo.

De cara, eu vou começar categórico: eu gosto do Dunga. Tipo, não estou afim dele (:P), mas sempre o considerei um jogador diferenciado, centro nervoso de um time campeão em 1994. Revendo os jogos, o cara lançava (na Copa do Mundo, não analiso aqui a carreira como um todo) tão bem quanto o endeusado Gerson (aquele da lei), e acho que ele tem feito um excelente trabalho no time, já há alguns anos, Canikerinho.

Não me incomodo nem um pouco dele não ter chamado o Ronaldinho Gaúcho, o Ganso, o Pato, o Neymar, etc. A memória de 2006, com o dream team naufragando de salto/trava alta, ainda está bem fresquinha. Nunca me encantei, e hoje em dia menos ainda, com jogador malabarista, mas pouquíssimo produtivo – muito menos com a eternidade da semana. E, in the end, só quem está lá dentro sabe se um jogador faz bem ou não para o grupo. Não digo que seja o caso dos que eu citei, e o próprio Robinho – que é xodó do Dunga – flerta o tempo todo com um lugar no circo. Mas tem provado nos amistosos e na Copa que soube amadurecer e concentrar na hora certa. E esse time corre… Pode errar, pode correr errado, mas sua, batalha. Sem referência alguma a qualquer patrocinador, este é um time de guerreiros, tal qual Dunga foi em campo.

Nos tweets aqui do blog, foi mencioado algo sobre patriotismo. Nas aulinhas do Ensino Médio e das faculdades por aí, sempre que querem exemplificar o conceito de nação, usam o futebol: é durante um jogo da Seleção que podemos ver com mais nitidez a união dos brasileiros, de norte a sul, em torno de um sentimento de pertencimento. Talvez seja também no futebol que ecoem mais facilmente os diferentes modelos desejados para o país. Claro que trata-se de imensa exptrapolação, e o futebol não deveria ter toda essa importância. Mas, no final, tem.

Tendem a não gostar do Dunga porque ele é, provavelmente, menos brasileiro típico do que gostariam que ele fosse. Ele não é brincalhão, não tem samba no pé, tem pouco jogo de cintura (em todos os sentidos), nenhum talento com a mídia e um foco mais obcecado que a média. Do jeito meio tosco dele, ele deixa claro isso nas entrevistas. Curiosamente, o Brasil precisou de pessoas assim para ser campeão do mundo, nos últimos 40 anos: o próprio Dunga em 1994, e o Felipão em 2002. Claro que o Felipão era um sarjentão mais doce, talvez temperado pela idade. Dunga raramente relaxa, e há poucas coisas menos brasileiras do que isso. O Dunga é uma espécie de anti-Lula – não politicamente (aliás, que fique claro que este texto não tem nada a ver com posição política, e sim com cultura), mas no jeitão.

O brasileiro pegou ojeriza, relativamente justificável, de tudo o que é mais “militar”, por assim dizer. Confunde qualquer voz de comando com autoritarismo, disciplina com falta de respeito pelo “individualismo”. E incomoda-se quando aparece alguém que quer por mais ordem na casa e busca efetivamente fazer por onde – com acertos e erros, que fique bem claro. O comportamento de Dunga é uma resposta ao que vimos em 2006. É bem possível que seja uma resposta exagerada, e que ele acabe matando uma mosca com um canhão. Vamos torcer para que, já que o Dunga já jogou no Japão, ele se lembre do bambu – não o mitológico bambu do Sílvio Santos, mas aquele que de inclina ao vento, para não quebrar.

Eu quero um Brasil campeão. Talvez, como eu disse, seja um exagero corrigir a casa-de-mãe-teixeira que foi 2006 com esse regime semi-prisional de 2010, mas, se isso é preciso para impedir que os atletas percam o foco (coisa mais fácil do mundo, em se tratando de brasileiros em geral, não só atletas), não me oponho. E todo mundo sabe que a imprensa sabe ser perversa quando quer, ao polemizar o que é relativamente comum, ao repetir à exaustão frases editadas, e – em especial a imprensa esportiva – ter uma de criatividade nas entrevistas menor do que a do meio campo da França. E eu não vou nem comentar a precipitação que foi incensar a Espanha.

Talvez o Dunga precise é brigar menos com a imprensa… não por amolecer com ela, mas por se importar menos. Levá-la menos a sério, que é a melhor coisa que todos fazemos. Mas é bem possível que seja difícil para ele, mesmo depois de 20 anos, conviver pacificamente com o mesmo povo que o execrou em 1990. Por outro lado, passou da hora da imprensa viver de passado. Hoje encontramos duas gerações de viúvas: as da genialidade da geração do fim dos anos 1950 e década de 1960, e as dos sobreviventes do Sarriá-Hiroshima.

Quem olha para o passado recente, não o do tempo dos deuses, sabe que a Seleção tem dificuldade com estreias, tem dificuldade com retrancas, e demora um pouco a se acertar. Mas também sabe que costuma voltar melhor no 2o tempo, que tem preparadores físicos diferenciados, e que, quando pega time grande, cresce que é uma beleza.

O Brasil, no futebol e fora dele, ainda vive o ideal romântico do gênio, do diferente, do cara que sozinho vai resolver. O grande talento, o cara que vai “chamar o jogo pra si”, e “num lampejo”, vai ganhar o jogo. Na economia, demorou para entenderem que não é um plano econômico milagroso que corrije as coisas, é um processo contínuo. Na política, o voto continua direcionado para o candidato e/ou para o carisma envolvido, não para suas ideias. No futebol, o conceito de jogo coletivo parece – por necessidade até – devagarinho já ser um pouquinho mais compreendido do que no social.

No seu jeito anti-Lula, com sua bolsa-Copa para jogadores medianos, mas merecedores, Dunga constrói um time que, se não encanta a todos, é mais aguerrido, e, mesmo com tropeços, vencedor. Eu concordo 100% com a convocação e a escalação? Claro que não, eu não concordo 100% nem comigo mesmo. Mas Dunga deu coesão ao time.

Eu torço para a Seleção de Dunga ir longe na Copa, porque eu torço para um Brasil mais Dunga, e menos Ronaldinho Gaúcho.

2 comentários:

Azul disse...

Um texto inspirado de vossa senhoria. Gostei da análise equilibrada de como Dunga e a seleção chegaram ao que são hoje e especialmente por descrever, através do futebol, o país que espera.

Renato Berlim

Felipe disse...

post chatão, hein... nao sei se é por causa da copa dos sonhos do Murici e do Parreira, mas...

O lance do patriotismo eu comentei. E ainda acho que uma coisa não tem nada a ver com outra. Na copa é como a propaganda do Carrefour: de 4 em 4 anos todo mundo torce pelo mesmo time. No Brasil, MUITA gente gosta de futebol. E ainda tem mais gente que torce só pela seleção. Por acaso, o "clube" que todo mundo torce usa verde e azul, a bandeira é a mesma do país e aí todo mundo põe bandeirinhas. Mas não é para falar: "minha terra tem palmeiras onde cantam..." é para falar: minha terra tem Palmeiras, Corinthians, Flamengo, São Paulo, etc... e hoje todos nós torcemos pelo Brasil"

Pátria de chuteiras, hinbo nacional, é só marketing. O povo mesmo quer saber de futebol. O nacionalismo não tem nada a ver com isso.

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